Ex-sargento da PM reencontra família após 9 anos morando nas ruas de Florianópolis

Policiais de Santa Catarina e Rio Grande do Sul se mobilizaram via redes sociais para levar Rogério Pereira, o Barba, de volta a Porto Alegre

 
Os acontecimentos das últimas duas semanas eram sinais de uma mudança definitiva na vida do morador de rua de Florianópolis, conhecido pelo apelido de Barba. Imundo, cabelos e barba desgrenhados, com apenas uma muda de roupa, ele perambulava na vida incerta pela região do Largo da Alfândega e do Mercado Público há pelo menos quatro anos. Foi por ali que, na quinta-feira, dia 22 de maio, Barba foi agredido por um grupo de pessoas. 

— Eu olhava para ele, todo machucado, e não acreditava. Porque poderiam fazer isto com ele? Ele nunca incomodava ninguém, não era de pedir coisas. Foi uma covardia — disse a estudante de administração, Janaína Lopes, de 21 anos, que conhece Barba há seis anos e costumava ajudá-lo quando passava pelo Centro.

O fato se repetiu na semana seguinte e por três vezes Barba teve que ser atendido no Hospital Celso Ramos, onde já havia uma ficha extensa sobre ele. 


Barba era figura certa do Mercado Público de Florianópolis (Crédito da Foto: Arquivo Pessoal / Facebook)

Barba era sargento da PM 

A agressão foi relatada por Janaína ao major Marcus Roberto Claudino, coordenador do projeto SOS Desaparecidos, que há um mês fazia pesquisa sobre a vida do tal morador. Através do militar aposentado Luiz Fernando da Silveira descobriu-se quem era Barba: Rogério Pereira, 48 anos, ex-sargento da Brigada Militar do Rio Grande do Sul, aposentado em 1986 após ter sido diagnosticado com esquizofrenia.

— Encontrei ele em 2011, em Barreiros, e pelas conversas que tínhamos vi que ele tinha uma história interessante. Com o nome dele, da irmã e do bairro, fui a Porto Alegre. Depois de caminhar uns quatro quilômetros, bati na porta da irmã, que reconheceu o irmão desaparecido — conta Silveira. 

Rosana e Julio Cesar Pereira vieram para Florianópolis tentar resgatar o irmão. 

— Aquela era a segunda vez que ele sumia. Da outra vez tinha sido dez anos. Quando a gente foi buscá-lo em Florianópolis, ele nos reconheceu e tudo, mas disse que não queria voltar mais. Falou que não precisava de ajuda — disse o irmão mais novo, Julio Cesar. 

Barba continuou na rua.


Major Roberto Claudino, do SOS Desaparecidos, encontrou Rogério Pereira na Rua Jerônimo Coelho na última segunda-feira (Crédito: SOS Desaparecidos / Divulgação)
Mobilização pelas redes sociais


O major Marcus Roberto Claudino está a frente do SOS Desaparecidos há quase dois anos. Apesar de dedicado ao projeto, em poucos casos ele se envolveu tanto quanto na história do sargento Rogério. Foi sua filha quem chamou sua atenção para a situação do morador de rua. 

— Minha filha pediu que eu ajudasse na história, pois ele era diferente dos outros moradores. Não andava em grupos, não usava drogas, não pedia comida, nem ajuda. Além disto, rejeita o recolhimento ao Centro POP, da Prefeitura de Florianópolis — disse o major. 

Depois de levantar a história dele, Claudino iniciou os contatos com a Brigada Militar do Rio Grande do Sul e a família para constatar que o Barba era Rogério. O objetivo era buscar um atendimento psiquiátrico, antes de promover um reencontro. Mas sem apoio para executar o plano, ele resolveu apelar. 

— Como a ajuda não vinha nunca, eu resolvi jogar nas redes sociais para sensibilizar mais gente e acabou dando certo — conta. 

postagem foi publicada na última sexta-feira, e desde então foram mais de 2,4 mil compartilhamentos. Eram amigos, ex-colegas de profissão e moradores da Capital que reconheciam a foto de Barba, dormindo na rua. 

Logo começou um movimento entre ex-policiais para trazer Rogério de volta. 

— Quando eu vi a foto falei “é o Pereira”! É raro acontecer de um brigadiano ficar nestas condições. A gente se envolveu para ajudar de alguma forma e trazer ele de volta. Agora esperamos que ele encontre a calma que procura — disse o ex-colega Jorge Alberto Nunes.


Rogério Pereira de óculos escuro e boné, ao lado de colegas do DPChoque, da Brigada Militar do Rio Grande do Sul (Crédito de Foto: Arquivo Pessoal / Facebook)

O reencontro

Depois de dois dias internado no Hospital Celso Ramos, Barba partiu em uma ambulância do Hospital Militar Lara Ribas, por volta das 8h desta quinta-feira. O único pertence, além das roupas, era a cadeira de rodas que ganhou de Janaína e outros amigos que ele fez nas ruas de Florianópolis. Chegou a Porto Alegre às 15h46min, e foi recepcionado na entrada do Hospital da Brigada Militar por ex-colegas da Tropa de Choque, a ex-mulher, um dos filhos e dois irmãos. 

— Chegou brincalhão, dizendo que logo vai voltar para as ruas, mas a gente vai ficar em cima, acompanhar o tratamento, para que ele tenha uma vida melhor a partir de agora — contou o irmão Julio César. 

A tenente Carla Flores, da Sessão da Assistência Social da Brigada gaúcha, disse que Rogério fica no hospital o tempo que for necessário. Enquanto isto, a família se dispos a refazer os documentos para que ele tenha de volta a pensão do Estado. 

E o major Marcus, que acabou embarcando junto com Rogério, acabou honrando com o compromisso assumido com a filha. 

— Missão cumprida.
 
Fonte: Zero Hora